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Stanley Parable: 10/10, não recomendaria

Stanley Parable é um jogo independente de 2014 que possivelmente passou desapercebido por muita gente. É uma obra de arte, mas eu não recomendaria pra todo mundo. Não recomendo logo de cara, porque até hoje tenho minhas dúvidas sobre o quanto Stanley Parable é um jogo de fato, ou se ele é uma crítica a como normalmente respondemos ao que os jogos nos apresentam como jogadores. Mas talvez ele seja tão bom pra você quanto foi pra mim.

O protagonista, Stanley, é um funcionário de uma empresa e seu trabalho consiste em apertar teclas em um computador conforme o programa na tela o instrui a fazê-lo. O jogo começa em um dia incomum quando aparentemente ninguém apareceu pra trabalhar, só ele, e há um narrador que fala tudo que Stanley vai fazer. Como jogador, obviamente você controla Stanley. Aí vai da sua vontade de seguir o que o narrador, que claramente é o destino que o jogo pretende que você obedeça, ou se vai fazer alguma outra coisa.

Piloto automático

Se não fosse pelas informações que o narrador fornece, Stanley não seria capaz de progredir na história. Seguir exatamente o que o narrador diz garante que você vai terminar o jogo no “final bom”. O ponto é que seguir a rota até o “final bom” leva uns 15 minutos no total. E o final em si é bem bostão. O que o jogo está fazendo é te punir por jogá-lo no piloto automático, sem questionar nada que a experiência te proporciona.

Em geral, jogos mais antigos mantinham um formato mais simples, onde “andar para a direita” garantia que você fosse chegar no final de uma fase e progredisse em direção ao final do jogo. Conforme evoluímos a tecnologia e o game design, fomos adotando formatos que permitem um maior número de interações.

Mais memória e processamento significam simulações maiores e mais semelhantes à do mundo real. Mais botões no controle significam mais formas de interagir com esse mundo. Mas é claro que isso vem com um custo: muita gente se perderia, e não saberia pra onde ir pra completar o que o jogo idealizou como “a experiencia definitiva”. O “final bom”.

pathindicator
Mario e Gradius e seu progresso de “andar para a direita”, Dead Space e Bioshock Infinite com seus mundos enormes e setinhas que indicam para onde ir.

Como solução, vários jogos acrescentaram funcionalidades que permitem que o jogador tenha uma dica de qual caminho deve seguir para chegar no seu próximo destino no rumo até o final do jogo. Uma bússola que aponta na direção que o level designer planejou que você fosse. 

Mas se tu sabe pra onde o jogo quer que tu vá e segue, o quão diferente você é de Stanley, o cara que segue instruções que aparecem na tela? O quanto esse recurso não se assemelha ao narrador, no sentido de que ele te fornece informações que talvez você não devesse ter? Quanto da experiencia de exploração você está perdendo ao ceder e usar esta funcionalidade?

Stabley Parable questiona se tu não ficou preso no tempo, e continua balizando a sua experiência pelo formato antigo: só andando dentro do trilho que o jogo quer que tu vá. O jogo te pune por tomar esse caminho. Rapidamente, Stanley Parable te provoca a fazer o que ele quer que tu faça de verdade: contrarie o narrador. Crie a sua experiência desta realidade. As possibilidades são quase infinitas, vai em frente e inventa.

Liberdade e a ilusão do livre arbítrio

A sensação de liberdade em um jogo de digital pode ser empoderadora e catártica. Quem já jogou Zelda vai entender. A câmera dá uma volta no cenário, a música começa – tímida – e o nome do mapa aparece em letras brancas na tela: Hyrule Field. O sentimento de liberdade toma conta de ti, e um universo cheio de possibilidades lhe é entregue nas mãos. É memorável: qualquer coisa é possível. Quem já jogou Skyrim vai entender. Abrir o mapa pela primeira vez e se dar conta do tamanho do mundo que está diante de ti, sabendo que qualquer lugar que você quiser chegar é uma meta atingível.

Contrariar o narrador em Stanley Parable te dá a opção de reconquistar essa sensação. E aí no momento que você começa a fazê-lo, o narrador começa a tentar te trazer de volta para o “caminho correto”, questiona se você duvida dele ou não está gostando da história que ele tem planejada. O jogo apresenta centenas de situações onde você tem uma opção que vai contra o que o narrador sugere, mas ao escolhê-las o narrador deixa bem claro que embora não fosse o que ele queria, ele está preparado para isso. Todas as escolhas estão mapeadas, tudo faz parte do plano dele, até o que ele não queria.

keikaku

 

PÁ. O jogo te rouba de novo do teu livre-arbítrio. Te joga na cara que jogos digitais, como um pedaço de software que usa memória e processamento finitos, não tem como criar de fato uma liberdade sem limites. Que tudo necessariamente tem que ter sido planejado para que seja possível naquela realidade. Te mostra o que já sabíamos: não dá pra ter o nível de flexibilidade de um RPG de mesa em um jogo digital. Ele te expõe uma ferramenta que literalmente todos os jogos digitais lançam mão: a ilusão de escolha.

Mas Diogo, como isso funciona? Como eu posso enganar o jogador que a escolha dele importa sem fazer ele se sentir um lixo? Suponhamos que eu queira fazer um jogo 100% justo onde tu tem exatamente as mesmas chances de ganhar, perder ou empatar. Um dos jeitos mais fáceis é fazer uma roleta, ou um desses lindos dados de 3 lados, e dizer que em um dos resultados do sorteio você perde, em outro ganha, e em outro empata.

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Os risquinhos em cada haste indicam qual número caiu.

Isso te coloca apenas como observador de um evento aleatório. É só um sorteio. Caso caia 1 no dado, o jogador 1 ganha. Caso caia 2 no dado, o jogador 2 ganha. Caso caia 3, eles empatam. É simples demais. Se eu permitir que cada jogador escolha uma de três opções, ainda posso manter as mesmas chances de ganhar:

jogador12
EMPATA PERDE GANHA
GANHA EMPATA PERDE
PERDE GANHA EMPATA

Possíveis resultados de um jogo de Pedra-Papel-Tesoura da perspectiva do Jogador 1

Pedra, Papel ou Tesoura pode ser um jogo meio trouxa, mas ele certamente já te dá aquela sensação de: “PUTZ, se eu tivesse colocado papel na última eu teria ganho!”. No momento em que você tem uma escolha, o fato de você fazê-la conscientemente faz você achar que o resultado do jogo é de sua responsabilidade, embora ainda seja probabilisticamente equivalente a um sorteio. Ter a agência sobre uma escolha que parece ter consequência deixa você emocionalmente investido no resultado. Parece um truque barato, mas quando bem construída, essa ilusão não é nem percebida pelo jogador e tem um efeito super positivo.

De fato, Stanley Parable se orgulha tanto de estar te mostrando que está te pregando esta peça, que em um dos trailers do jogo, o narrador faz uma sacanagem com um dos beta testers que reclama exatamente que parece que o jogo não deixa ele fazer nada:

Tanto faz se tu segue as instruções do narrador ou não, cada vez que tu chega em um dos finais do jogo, ele se reinicia, e eventualmente muda as suas próprias regras. Cenários não são mais do jeito que tu lembra, algumas portas somem, e eventualmente é até possível que o narrador desapareça, numa vibe de “o que você faria sem as instruções?”. O jogo tem vários finais diferentes, todos igualmente provocadores. Então talvez a liberdade que ele te proporciona não seja dentro do próprio jogo, mas de abrir sua mente em relação a como tu joga normalmente.

Trapaça e a subversão da mecânica do jogo

Uma das formas de realmente sair do escopo de interações planejadas entre jogador e jogo, muito comum entre speedrunners, é descobrir um erro de programação, ou um glitch que te permitem ignorar algumas das regras de movimentação ou transição de mapas, que permita completar o jogo em um tempo muito mais rápido que o imaginado. De fato esta comunidade é tão dedicada que chegam em absurdos como ver os créditos de Super Mario World (SNES) em menos de 1 minuto e meio:

É uma interação realmente única com um jogo digital, e certamente não foi planejada pelos autores do jogo. Mantendo a pose de “tudo que dá pra fazer aqui eu já planejei”, Stanley Parable nos presenteia com um achievement, ou troféu:

spachievementspeedrun

Ele prevê que usuários tentarão encontrar esses truques pra zerar o jogo o mais rápido possível, e inclui uma recompensa para quem o fizer. Essa interação também foi planejada. Outro achievement curioso tem o texto “é impossível obter esta conquista”. Nos fóruns, vários jogadores relataram terem conseguido obtê-la, mas não sabiam exatamente como. Haviam muitas dúvidas de se realmente era possível fazer isso, até que alguém fez engenharia reversa no código do jogo e descobriu quais são as condições necessárias para obtê-lo. Assim que isso bateu na internet, o desenvolvedor original mudou as condições que fazem com que isso seja possível, então não era mais possível obtê-lo daquela maneira.

Outro resultado interessante de tentativas de subversão do jogo foi que algumas pessoas perceberam que havia um mapa nos arquivos do jogo que não era acessível a partir de nenhum lugar. Aí alguns espertinhos usaram o console, uma funcionalidade que permite que você entre com comandos, normalmente usados para carregar modificações ou até mesmo trapacear, e carregou o mapa “secreto” à força:

Trapaça, o jeito mais agressivo de subverter as regras do jogo, está prevista, e lhe dá um diálogo brilhante com o narrador como recompensa. Da mesma maneira que Disgaea incentiva você a aprontar com seus personagens demoníacos, Stanley Parable te incentiva como jogador a procurar interações no seu jogo favorito que sejam interessantes para o seu perfil como jogador. Recomendo o jogo como uma forma de repensar que partes dessas grandes ilusões mais lhe agradam, e apreciá-las mais nos futuros jogos que você comprar. Se ficou interessado, ele está disponível na Steam por este link aqui.

Sorte? Eu faço minha própria sorte.

Aff, tu só ganha na sorte, velho. É muito roubado isso, esses movimentos que dependem de sorte não deviam estar no jogo. É um jogo de competição, devia ser uma disputa de habilidade, não de quem nasceu com a bunda mais virada pra lua. Tu sempre dá crítico, eu nunca. Os dados estão contra mim, a vida está contra mim, ó ceus.

Todo mundo tem um amigo assim. Um amigo que fica extremamente nervoso quando algum dos elementos de um jogo competitivo não está no controle completo das mãozinhas dele. Um amigo que vai pra academia malhar os dedos. Que acha que o melhor time ou jogador sempre devem vencer, e que quando isso não acontece, é roubalheira. Um amigo que joga futebol a vácuo, dentro de um domo de vidro em um campo perfeitamente plano, com uma bola perfeitamente esférica, nas CNTP. Ele acredita que competições de verdade são completamente determinísticas e se ele não tiver controle total de todos os elementos do jogo, ele perdeu porque deu azar, porque o time dele é um lixo e não faz o que ele manda, o jogo não é justo e não é um bom demonstrativo das suas habilidades. Ele tem alergia a rolagem de dados, comprar cartas e cara-ou-coroa, e toda vez que um jogo apresenta elementos de aleatoriedade, e xadrez é o jogo definitivo.

Como você caro leitor já está acostumado (ou deveria estar), vamos mostrar que elementos de sorte podem ser usados para adicionar uma nova camada de desafio em um jogo, e pode estar medindo uma habilidade que o perfil de jogador acima está ignorando completamente. Vamos falar de como sorte pode sim medir um tipo de habilidade.

Magic: The Gathering e a batalha antes da batalha

Para quem não conhece o TCG mais popular do mundo, este é um jogo que faz com que os jogadores assumam o papel de dois conjuradores que usam feitiços representados em formas de cartas para derrotar seu adversário. De maneira simplificada, tem cartas que dão dano no seu oponente, e para usá-las o jogador tem que pagar um custo que varia com o poder da carta: cartas mais fortes custam mais, cartas mais fracas custam menos. Para pagar esse custo, é necessário usar cartas do tipo “terreno”, que estão lá apenas para isso. Elas não fazem nada no jogo exceto pagar o custo das cartas que dão dano. Então boa parte do seu baralho (ou deck), são essas cartas que de maneira prática não fazem nada demais.

Existe um ódio enorme em cima dessas cartas. Se você estiver com muito azar, é possível que você caia em uma das seguintes situações:

  1. Você não compra nenhuma carta de terreno. Tudo o que você tem nas mãos são feitiços de dano, mas você não pode jogar nenhum, pois não tem como pagar os custos.
    Esse cenário é conhecido como Mana Screw.
  2. Você só compra cartas de terreno. Você poderia pagar pelo custo de vários feitiços de dano, mas não tem nenhum pra jogar.
    Esse cenário é conhecido como Mana Flood.

Esses cenários podem acontecer com qualquer um, inclusive em um cenário competitivo, e dependem apenas de sorte. Já houveram casos de jogadores que perderam campeonato por puro azar de cair numa dessas situações. Então há uma parcela de jogadores significativa que acha que MTG não deveria usar terrenos. A popularidade dessa sugestão explodiu no lançamento de Hearthstone, um jogo de cartas eletrônico que não requer que terrenos sejam usados. O que ele faz de diferente é que a cada rodada, ele faz de conta que você comprou um terreno, então conforme o jogo vai avançando, ele vai deixando você jogar cartas de custo maior.

badhandmtg
Só compro terrenos tem umas 10 rodadas já. A próxima carta tem que ser uma criatura, pelo amor…

O que passa batido nessa idéia, é que a função dos terrenos em Magic vai muito além da sorte. Quando um jogador está selecionando quais cartas quer colocar em seu baralho, ele tem que considerar quais as chances dele começar o jogo com cada uma das cartas na mão. Cartas mais necessárias no início do jogo devem ser mais abundantes para aumentar suas chances. Colocar mais feitiços de dano e menos terrenos aumentam a força geral do seu deck, mas também aumenta a probabilidade de você ficar em um dos estados onde não pode jogar nada. É um equilíbrio delicado.

Essa questão do equilibrio entre dano e recursos é ressaltada quando Magic não impõe um limite máximo de cartas. Seu baralho tem que ter no mínimo 60 cartas, mas o número máximo pode ser o que você quiser, desde que você consiga embaralhar seu próprio deck. Então você poderia colocar um monte de cartas de feitiços danosos muito, muito fortes, e um montão de terrenos pra garantir que você vai ter recursos parar usá-las, mas quanto mais cartas tem no seu baralho, mais diluídas ficam as chances de você sacar as cartas certas na hora certa. Considerar essas probabilidades e construir seu baralho considerando o efeito que a quantidade de cada carta tem na sua estratégia geral é a marca de um bom construtor de decks.

Nossa, mas meu oponente sempre tem a carta certa na hora certa na mão dele, esse cara só pode estar trapaceando.

Ou ele simplesmente constrói decks melhor que você. Vale lembrar que uma vez pronto o baralho, pouca coisa pode ser mudada durante a partida. Através do fator aleatório de não saber quais cartas você vai comprar, a habilidade que Magic está medindo aqui é a capacidade de cada jogador de estimar essas chances e montar uma estratégia consistente a longo prazo, independente do adversário que está sendo enfrentado. Então quando dizemos que medir sorte e habilidade são mutuamente excludentes, não estamos considerando o que o jogo está considerando como habilidade.

mtgstats
Ferramentas como o deckstats.net permitem que você veja a probabilidade de você começar com ou comprar cada carta do seu deck, se sua quantidade de terrenos está correta, etc.

Um dos modos de jogo alternativos sugeridos na comunidade para “remover sorte” da equação gira em torno de não ter nenhum terreno no baralho, mas você pode jogar qualquer carta no tabuleiro de cabeça pra baixo como se fosse um terreno. Ou seja: você tem que decidir quais feitiços você vai sacrificar para poder jogar outros melhores. A ironia nessa sugestão é que essa é exatamente a mesma natureza de decisão que você tem que tomar quando está decidindo quantos terrenos e quantas cartas de dano vai botar em seu deck, a única diferença sendo que nesse modo de jogo você pode fazer esse ajuste durante o jogo. Mede um conjunto de habilidades mais imediatista do que a idéia original, mas não é uma má idéia.

A decisão de MTG por usar terrenos não é a questão de puramente manter um elemento de pura sorte em seu jogo. A consequência dessa decisão é que a batalha entre os jogadores começa muito antes deles sentarem em suas cadeiras um de frente pro outro. Hearthstone, que não possui o conceito de terrenos, não tem essa dinâmica tão presente em seu design, e ironicamente passa a depender mais da sorte de comprar as cartas certas na hora certa, pois as possibilidades que os jogadores têm de manipular as chances de comprar o que eles precisam são muito menores. Isso é condizente com os comentários sobre o jogo em seu nível mais alto: vários jogadores de Hearthstone já demonstraram seu descontentamento com o fato de que o jogo depende muito, muito de sorte.

  Habilidade Sorte
Habilidade vence EU SOU DEMAIS VOCÊ NÃO TINHA NEM CHANCE
Sorte vence VOCÊ NÃO CONTAVA COM ISSO, HEM? Err… Eu acho que ganhei.

 

As ferramentas que o jogo dá para estimar e manipular as chances de eventos aleatórios acontecerem estão intimamente ligadas com a percepção dele ser justo ou não. O fato de MTG usar terrenos para fazer esse controle de probabilidades é o que o diferencia do problema pelo qual Hearthstone está passando. Com um deck de apenas 30 cartas e com muito menos cartas disponíveis para manipular essas probabilidades, Hearthstone cai no quadrante mais deprê da tabela acima.

Poker Texas Hold’em é um jogo que mesmo com poucas cartas, dá ferramentas para os jogadores terem acesso parcial à probabilidades através de conhecimento comum. Parte das cartas do jogo ficam com a face virada para cima no centro da mesa, e podem ser usadas por qualquer jogador para tentar obter a melhor combinação. Baseado nas cartas que você tem em mãos, e nas que estão na mesa, um jogador habilidoso pode ter uma boa noção de quais as chances de seus adversários terem uma combinação melhor que a sua, e embora o jogo seja muito baseado em sorte, os melhores jogadores consistentemente chegam no topo.

Pokémon e gerenciamento de risco

Pokémon é um jogo que lida com sorte em sua fundação. Golpes mais fortes em geral têm menos chances de acertar, e golpes mais fracos são mais confiáveis. Escolher quais golpes você vai botar em seus monstrinhos passa a ser um jogo de gerenciar risco. Mesmo que a probabilidade de um golpe acertar seja uma informação conhecidíssima por todos, tem gente que JURA que um golpe com 70% de chance de acertar vai errar toda vez que você precisar, uma narrativa que emergiu da comunidade com tanta, mas tanta força, que acabou indo parar no desenho. Contemplem o Focus Miss.

Vamos dar uma olhada em como a comunidade de jogadores considera os riscos envolvidos na decisão de usar um golpe forte e impreciso vs. um golpe fraco e preciso. Usando o banco de dados da Smogon, podemos ver quanto cada golpe é usado, tanto por jogadores de niveis mais altos como por jogadores de niveis mais baixos. Usamos os dados de julho de 2016 e comparamos dois pares de golpes:

Hydro Pump vs. Surf

Hydro Pump é mais forte, mas menos preciso. Surf é mais fraco, mas acerta sempre.

hydrosurf

Golpe % de escolha em nível baixo % de escolha em nível alto
Hydro Pump 65.4% 69.3%
Surf 34.5% 30.6%

Proporcionalmente, o golpe mais arriscado é preferido por jogadores de nível mais alto, que também conhecem recursos que minimizam o impacto de um golpe errar. Nos níveis mais baixos, a preferência por Surf, a opção mais segura, é quase 4% maior.

Thunder vs. Thunderbolt

Thunder é mais forte, mas menos preciso. Thunderbolt é mais fraco, mas acerta sempre.

thundernbolt

Golpe % de escolha em nível baixo % de escolha em nível alto
Thunder 23.8% 28.3%
Thunderbolt 76.1% 71.6%

Proporcionalmente, o golpe mais arriscado é preferido por jogadores de nível mais alto, que também conhecem recursos que minimizam o impacto de um golpe errar. Nos níveis mais baixos, a preferência por Thunderbolt, a opção mais segura, é 4.5% maior.

É interessante notar que embora Hydro Pump seja a opção preferida dentre os golpes de água, Thunder, a opção mais forte dos golpes elétricos, não mostra a mesma tendência pois é 10% mais impreciso. Isso deixa claro que gerenciamento de risco é algo extremamente presente na decisão de qual golpe escolher para o seu time, e da mesma maneira que comentamos sobre Magic, ensinar um golpe a um pokémon significa que essa decisão não pode ser alterada durante a batalha. É uma escolha que requer planejamento.

Mais fácil sortear o troféu, então

Como últimas considerações, vale a pena lembrar o seguinte: tanto em MTG quanto em Pokémon quanto em vários jogos que tem bastante presença de elementos aleatórios, os campeonatos de alto nível em geral fazem disputas no formato “melhor de 3” ou “melhor de 5”. O motivo para isso é evidenciar que a vitória está acontecendo não por que o jogador teve mais sorte, mas para mostrar que o controle dele sobre situações que podem acontecer com uma certa probabilidade é superior ao do seu adversário. A grande maioria dos jogos tem algum elemento de sorte em algum grau, e quanto maior a possivel variabilidade de resultados que um atleta pode obter, mais amostras estatísticas devem ser coletadas.

luckskill

É por isso que esportes como Tiro ao Alvo pedem que atletas dêem vários tiros: trata-se de uma competição com uma variação muito grande de resultados até mesmo para atletas de altíssima performance. Qualquer micro contração muscular, brisa, mudança na umidade, espirro do árbitro, podem afetar os resultados. Então mais amostras são avaliadas para medir a consistência do competidor.

Claro, aqui nós demos alguns bons exemplos do uso de sorte em jogos com o objetivo de medir alguma habilidade, mas há péssimos exemplos onde a sorte só está adicionando desequilibrio e não está proporcionando um novo desafio aos jogadores. Há algum tempo atrás, League of Legends eliminou uma estatística chamada Dodge de seu jogo, onde era possível aumentar as chances de que ataques dos inimigos não dessem dano nenhum em seu campeão. Sem ferramentas estratégicas o suficiente para que os adversários pudessem contornar isso, acabou virando uma estratégia dominante: todo mundo aumentava seu Dodge e ganhava quem desse mais sorte de não tomar dano.

Poderíamos falar sobre dano crítico, sobre evasão em Pokémon (que honestamente não é nem de perto tão ruim quanto era em League of Legends), mas aí entraríamos na categoria MATEMÁTICA DO INFERNO, então vamos deixar isso para outro post.

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Da próxima vez que seu amigo lhe disser que você ganhou na sorte, compartilhe esse post com ele!